sexta-feira, 24 de maio de 2013


Veto a Estrangeiros na Segurança Privada



Correio Braziliense - 19/04/2013Autor(es): HELENA MADER
 

Às vésperas de grandes eventos internacionais, como a Copa das Confederações, a Copa do Mundo e as Olimpíadas, o Congresso Nacional vai discutir a participação de estrangeiros em empresas de segurança privada. Tramita na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados um projeto que suspende a compra de uma empresa brasileira do setor por uma multinacional estrangeira. O caso, que servirá de parâmetro para outras negociações semelhantes, é acompanhado com atenção por empresas de fora interessadas nesse nicho de mercado. O projeto de decreto legislativo que será analisado na Câmara suspende um parecer do Ministério da Justiça assinado no ano passado. A pasta contrariou a orientação da Polícia Federal e liberou a entrada de uma multinacional no setor de segurança privada.

A negociação que será debatida no Congresso é a compra da empresa paulista Vanguarda pela SSE do Brasil Ltda., subsidiária brasileira da multinacional britânica G4S — uma das líderes mundiais do mercado de segurança, com presença em 125 países. No ano passado, os estrangeiros pediram autorização ao Ministério da Justiça para fechar o negócio. A Polícia Federal deu parecer contrário, mas a Consultoria Jurídica do ministério ignorou o entendimento da PF e liberou a aquisição. Entidades como federações e associações que representam empresas brasileiras de segurança e transporte de valores recorreram à Justiça contra a negociação, mas ainda não houve análise do caso. Agora, a Comissão de Constituição e Justiça vai apreciar o projeto de Decreto Legislativo n° 816/2013, do deputado Nelson Pellegrino (PT-BA). Apesar de integrar a base do governo e o partido da presidente Dilma Rousseff, o parlamentar quer cancelar a autorização concedida pelo Ministério da Justiça.

Pellegrino, que já atuou como advogado de sindicatos que representam trabalhadores do setor de segurança privada, afirma que vai procurar o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para discutir o caso mais uma vez, antes da votação do assunto na CCJ da Câmara. “Há um interesse grande no setor por conta dos eventos internacionais. Vai haver um fluxo imenso de agentes estrangeiros fazendo a segurança de delegações e esse é um tema que precisa de debate urgente, para estabelecer como isso será feito”, explica o deputado.

Com o intuito de conseguir a autorização para o negócio, a G4S alegou que “é uma sociedade empresarial limitada brasileira, com sede e administração no Brasil, apesar de ter participação estrangeira em seu capital social”. Mas o Parecer n° 154/2012 da Polícia Federal afirmou que o artigo 11 da Lei n° 7.102/1983 “veda de forma ampla e expressa a participação direta ou indireta de estrangeiros na atividade de segurança privada”. O parecer lembra ainda que essa legislação proíbe que estrangeiros tenham a propriedade ou administrem empresas de segurança privada — à exceção das empresas que, à época da criação da lei, já tinham sócios estrangeiros.

“Direito adquirido”
As empresas G4S e SSE apresentaram documentos, como contratos sociais, alegando que “as empresas constituídas antes da lei têm direito adquirido de incluírem estrangeiros em seus quadros societários”. O parecer da Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça acatou os argumentos dos empresários. O documento afirma que “não se pode ferir o direito adquirido das empresas especializadas instituídas antes do advento da Lei n° 7.102/1982”. O texto diz ainda que a empresa brasileira adquirida na negociação foi fundada em 1975, “quase oito anos antes da vigência da Lei 7.102/1983”. “A economia brasileira está aberta ao investimento de capitais estrangeiros, sendo irrazoável e desproporcional presumir uma limitação implícita à origem do capital social de empresas brasileiras constituídas segundo as normas nacionais, com sede e administração em território pátrio”, afirma um trecho do parecer, datado de 15 de junho de 2012 e assinado por Tatiana Malta Vieira, chefe da Divisão de Atos Normativos da Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça.

Três semanas depois, o parecer foi acatado pelo coordenador de Estudos e Pareceres da Conjur do Ministério da Justiça, Rogério Pereira. A então ministra interina, Márcia Pelegrini, atual secretária executiva da pasta, liberou o negócio entre a Vanguarda e a G4S. A decisão saiu no Diário Oficial da União de 6 de julho do ano passado. Até o fechamento desta edição, o Ministério da Justiça não havia comentado o assunto.

O presidente da Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores, Odair Conceição, classifica o ato do Ministério da Justiça que liberou o negócio como “ilegal e absurdo”. A entidade luta na Justiça para cancelar a compra da Vanguarda pela G4S e torce para que o Congresso aprove a proposta de decreto legislativo. “O governo rasgou uma lei com 30 anos de vigência. A legislação proíbe textualmente o ingresso de empresas estrangeiras, já que o setor de segurança é uma atividade essencial e estratégica”, justifica. “As empresas multinacionais estão de olho nos grandes eventos que o Brasil vai sediar, por isso esse caso é tão relevante, já que servirá de base para outras discussões futuras sobre o assunto”, acrescenta Odair Conceição.

"O governo rasgou uma lei com 30 anos de vigência. A legislação proíbe textualmente o ingresso de empresas estrangeiras, já que o setor de segurança é uma atividade essencial e estratégica"
Odair Conceição, presidente da Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores

O que diz a lei
A Lei Federal n° 7.102 de 1983 trata sobre a segurança de estabelecimentos financeiros e estabelece normas para a constituição e o funcionamento das empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de valores. O artigo 11 dessa legislação, que gerou a controvérsia no caso da aquisição da empresa paulista Vanguarda, determina que “a propriedade e a administração das empresas especializadas que vierem a se constituir são vedadas a estrangeiros”. A Lei n° 7.102 também veda o funcionamento de qualquer estabelecimento financeiro em que haja guarda de valores ou movimentação de numerário que não possua sistema de segurança. 

Ainda de acordo com a legislação de 1983, “as empresas especializadas em prestação de serviços de segurança, vigilância e transporte de valores, constituídas sob a forma de empresas privadas, poderão se prestar ao exercício das atividades de segurança privada a pessoas, a estabelecimentos comerciais, industriais, de prestação de serviços e residências, a entidades sem fins lucrativos e a órgãos e empresas públicas”.

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